HISTÓRIA E FILOSOFIA

quarta-feira, 23 de março de 2011

KU KLUX KLAN - O círculo fechado de um clã




     O Fim da Guerra Civil Americana, em 1865, parecia prenunciar paz e prosperidade para os Estados Unidos. Apesar do grande número de baixas verificadas durante a guerra (aproximadamente 600 mil pessoas), a convicção dos vitoriosos nortistas em relação a seus propósitos econômicos (investimentos na ampliação do mercado interno; desenvolvimento da estrutura industrial) e a libertação dos escravos (que permitiria maior justiça social e a ampliação do mercado consumidor), pareciam ser as mudanças fundamentais para consolidar o país na condição de maior potência continental e, num segundo momento, permitir alcançar a primazia mundial.

    Não contavam os norte-americanos com uma outra "guerra" que se iniciaria em seu território. Realizada, como a anterior, por motivos raciais. Não chegaria a atingir a condição de verdadeira batalha, mas faria um enorme estrago e inúmeras vítimas. Baseava-se no incontido ódio e desprezo dos brancos sulistas pelos negros, com os quais, de acordo com as novas leis que vigoravam no país, teriam que conviver em pé de igualdade.
     Não que isso tenha se estabelecido plenamente, apesar dos esforços constantes de membros do Congresso norte-americano. Entre suas iniciativas, logo após o final da Guerra de Secessão, ainda no ano de 1865, destacou-se o surgimento de um departamento governamental chamado de "Escritório da Liberdade" (Freemans Bureau). Tinha por objetivo auxiliar os ex-escravos a conseguir emprego, educar-se e ter acesso a serviços de saúde. Chegou a gastar, apenas no seu primeiro ano de funcionamento o equivalente a U$ 17 milhões para criar 100 hospitais, 4000 escolas, fornecer alimentos e abrigo para os ex-escravos.
     Sofreram com os vetos impostos pelo presidente Andrew Johnson, em 1866, dificuldades para ampliar suas atividades. Johnson, inclusive, vetou a Lei de Direitos Civis (Civil Rights Bill) que tinha por objetivo evitar que os estados do sul aprovassem leis estaduais discriminatórias, conhecidas como Black Codes (através dessas leis, os sulistas proibiam os negros de participar de pleitos eleitorais, vetavam sua participação como jurados em tribunais, os impediam de carregar armas em lugares públicos e, além disso, restringiam seu acesso a certas profissões e trabalhos).

     Em 1866, devido às novas eleições, a quantidade de congressistas favoráveis a defesa dos direitos civis aumentou. Foi votado o Reconstruction Act através do qual, os homens negros passavam a ter direito de votar e novas eleições foram convocadas em cada um dos estados sulistas. Essas leis também incluíam o direito dos novos governadores voltarem a ter representantes no Congresso caso ratificassem a 14ª Emenda Constitucional e dessem garantias ao voto dos negros. Apesar da tentativa de veto de Andrew Johnson, a lei foi aprovada pelo Congresso.
     Como reação às medidas favoráveis a integração dos negros a sociedade sulista, surgiu em 1866 a Ku Klux Klan, no estado do Tennessee. Um ano depois a organização já havia crescido e atingia outras regiões. A maior parte dos líderes eram ex-soldados do exército sulista que haviam lutado contra a abolição na Guerra de Secessão. Já adotando, desde então, as vestes pelas quais ficariam mundialmente conhecidos, com seus rostos e corpos cobertos por lençóis brancos até o tornozelo. Iniciava-se uma história de violências e atrocidades sem igual nos registros norte-americanos. Perseguições aos negros e, posteriormente, a ampliação de seu raio de ação, com ações radicais e covardes contra outras minorias como os judeus, católicos, socialistas, comunistas, simpatizantes dos direitos civis e hispânicos.
     As primeiras ações da KKK, como passou a ser chamada, estabeleceram como prioridade combater o direito de voto dos negros (maior símbolo de acesso à cidadania e aos direitos); no desenvolvimento de suas ações, os membros da Klan contaram com o auxílio de outras instituições racistas norte-americanas, como a Irmandade Branca (White Brotherhood), os Homens da Justiça (Men of Justice), os Guardiões da União Constitucional (Constitutional Union Guards) e os Cavaleiros da Camélia Branca (Knights of White Camelia).


     
     Os ataques violentos prosseguiram com enforcamentos, incêndios em casas de negros, mortes por espancamento,...
      O governo federal norte-americano, através de investigações e leis criadas pelo Congresso e pelo presidente Ulysses S. Grant, ainda nos anos 1870, tentaram inviabilizar as ações da Ku Klux Klan. Descobriram que a organização já tinha um código de leis próprias, através das quais definia que todo o membro da Klan teria que providenciar seus próprios trajes e, no mínimo, possuir uma pistola; o governo descobriu ainda que as ações violentas ocorriam preferencialmente à noite e que as vítimas eram retiradas de suas próprias casas, arrastadas para locais pouco aprazíveis, torturadas de forma desumana e mortas com crueldade.
     O Surgimento da lei conhecida como Ku Klux Act, em 1871, deu ao presidente autonomia para intervir nos estados sulistas. Isso permitiu que a Klan fosse extinta (se não totalmente, ao menos, parcialmente) até 1915.
     O retorno da organização nos anos 1910 e, seu espetacular crescimento nos anos 1920, entretanto causaram enorme preocupação as autoridades. Foi a partir desse momento histórico específico que a Klan passou a perseguir pessoas de outras origens (inclusive estrangeiros), além dos negros. Em 1925, a KKK chegou a ter 4 milhões de filiados. E o pior de tudo, a impunidade continuava. Dificilmente um membro da Ku Klux Klan era preso ou, ainda mais raro, condenado.
     O final da década de 1920, no entanto, não foi dos mais felizes para a Klan. Abalada por escândalos envolvendo alguns de seus principais membros, relacionados a denúncias de corrupção (como o prefeito de Indianápolis); tendo sofrido a perda de seu líder máximo, preso por assassinato e, numa época de terrível crise social e econômica (em decorrência do Crack da Bolsa de Nova Iorque, em 1929), o número de "associados" da KKK baixou para 30 mil.
     
     A força do grupo retornou a partir dos anos 1950, com o crescimento a nível nacional do Movimento de Direitos Civis (Civil Rights Movement). Prevalecia no Sul do país a lógica perniciosa que dizia que os negros eram "iguais" mas que teriam que ter acesso aos direitos "separadamente". Isso significava na prática que os negros teriam acesso à educação, ao transporte público ou a saúde, desde que, em locais diferenciados em relação aos brancos. Não só separados, mas também, de qualidade inferior.
Apesar de, legalmente, terem direito de votar, os negros não se registravam como eleitores por medo das violentas reações da Klan, entre as quais, a mais comum nessa época era o linchamento.
     Somente a partir das décadas de 1970 e 1980, quando os tribunais sulistas (pressionados pela opinião pública e pelo governo federal), se dispuseram a julgar de forma imparcial os crimes cometidos pelos brancos, a Ku Klux Klan sofreu fortes abalos que fizeram com que ela, inclusive, para pagamento de indenizações, tivesse que desembolsar montantes equivalentes a 7 milhões de dólares e perdesse boa parte de seu patrimônio e sua base de sustentação e sobrevivência.