HISTÓRIA E FILOSOFIA

sexta-feira, 29 de julho de 2011

EM QUE A CRENÇA DIFERE DO CONHECIMENTO?

"Em muitas pessoas a palavra antecede o pensamento, sabem apenas o que pensam depois de terem ouvido o que dizem."

                                                          
Gustave Le Bon (1841-1931)

Procuremos primeiramente precisar o que constitui crença e em que ela se distingue do conhecimento. Uma crença é um ato de fé de origem inconsciente, que nos força a admitir em bloco uma ideia, uma opinião, uma explicação, uma doutrina. A razão é alheia, como veremos, à sua formação. Quando ela tenta justificar a crença, esta já se acha formada.
     
Tudo quanto é aceito por um simples ato de fé deve ser qualificado de crença. Se a exatidão da crença é verificada mais tarde pela observação e a experiência, cessa de ser uma crença e torna-se um conhecimento.
     
Crença e conhecimento constituem dois modos de atividade mental muito distintos e de origem muito diferentes: A primeira é uma intuição inconsciente provada por certas causas independentes da nossa vontade; a segunda representa uma aquisição consciente, edificada por métodos exclusivamente racionais, tais como a experiência e a observação Foi somente numa época adiantada da sua história que a humanidade, imersa no mundo da crença, descobriu o conhecimento. Quando aí se penetra, reconhece-se que todos os fenômenos atribuídos outrora às vontades de seres superiores se apresentavam sob a influência de leis inflexíveis.
     
Pela simples circunstância de que o homem se iniciava no ciclo do conhecimento, todas as suas concepções do universo se transformaram.
     
Mas, nessa nova esfera, não foi ainda possível penetrar muito longe. A ciência reconhece cada dia que nas suas descobertas há muitas coisas desconhecidas As realidades mais precisas ocultam mistérios. Um mistério é a alma ignorada das coisas.
     
A ciência se acha ainda envolta nessas trevas e, atrás dos horizontes que ela atinge, outros aparecem, perdidos num infinito que parece recuar sempre.
     
Nesse grande domínio, que nenhuma filosofia pode ainda elucidar, jaz o reino dos sonhos, repleto de esperanças; que nenhum, raciocínio poderia destruir. Crenças religiosas, crenças políticas, crenças de toda espécie aí haurem uma força ilimitada. Os fantasmas-temidos que o habitam, são criados pela fé.
     
Saber e crer permanecerão sempre como coisas distintas. Ao passo que a aquisição da menor verdade científica exige enorme labor, a posse de uma certeza baseada unicamente na fé não pede nenhum trabalho. Todos os homens possuem crenças; muito poucos se elevam até ao conhecimento.
     
O mundo da crença possui a sua lógica e as suas leis. O sábio tem sempre tentado em vão penetrar nessa esfera com os seus métodos. Ver-se-á nesta obra porque perde ele todo o espírito crítico, quando se insinua no ciclo da crença e aí se vê somente perante as mais falazes ilusões.

Trecho do livro - As opiniões e as crenças
De: Gustave Le Bon

http://pt.wikipedia.org/wiki/Gustave_Le_Bon